Conquista do MST, IV Romaria pela Ecologia Integral, VI Abraço na Serra do Curral e Emergência Climática em MG. Por frei Gilvander Moreira[1]
Ato Público de Declaração de Emergência Climática em MG, na represa de Vargem das Flores, em Contagem, MG, dia 05/06/23. Foto: Frei Gilvander MoreiraO Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) conquistou sentença judicial da Vara Agrária do Tribunal de Justiça
de Minas Gerais (TJMG) garantindo a posse do Quilombo Campo Grande para 459
famílias que ocupam o latifúndio da ex-usina Ariadnópolis há 25 anos, no sul de
MG, no município de Campo do Meio. Dia 23 de março de 2023, a juíza Janete
Gomes Moreira, substituta da Vara Agrária TJMG, baixou sentença negando
reintegração de posse ao espólio da ex-usina Ariadnópolis que reivindicava
judicialmente o despejo do Acampamento Quilombo Campo Grande, composto por 459
famílias que se auto-organizam e subdividem-se em 12 Acampamentos, quais sejam:
Acampamento Girassol, com 45 famílias; Acampamento Potreiro, com 63 famílias;
Acampamento Fome Zero, com 30 famílias; Acampamento Resistência, com 43
famílias; Acampamento Tiradentes, com 27 famílias; Acampamento Rosa Luxemburgo,
com 76 famílias; Acampamento Irmã Dorothy, com 13 famílias; Acampamento Chico
Mendes, com 16 famílias; Acampamento Betinho, com 27 famílias; Acampamento
Sidnei Dias, com 78 famílias; Acampamento Marreco-Vitória da Conquista, com 31
famílias e Acampamento Coloninha, com 13 famílias.
Na decisão a juíza fundamentou sua
decisão justa, constitucional e sensata usando, dentre outros, os seguintes
argumentos jurídicos: “Para obter a
procedência de sua pretensão, cabe ao autor provar, nos termos do artigo 561 do
Código de Processo Civil, (I) sua posse. Possuidor é aquele que tem de fato o
exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade, conforme
artigo 1.196 do Código Civil. Ou seja, é considerado possuidor aquele que tem,
de fato, o exercício dos poderes de fruição, ou utilização, ou reivindicação ou
disposição da coisa.” O espólio da ex-usina Ariadnópolis não comprovou ter
posse.
Laudo Socioeconômico e Produtivo das
Comunidades Rurais da Área da Companhia
Agropecuária Irmãos Azevedo (CAPIA), desenvolvido pela Secretaria do Estado
de Desenvolvimento Agrário (SEDA) (Id. 6437348032), concluiu que “as famílias organizadas pelo MST realizaram
a primeira ocupação das áreas da antiga CAPIA no ano de 1998, o que restou
demonstrado através de imagens de satélite de 2004 a 2018 o processo de
ocupação das famílias nas áreas”. A requerente CAPIA não comprovou que
exerceu a posse anterior sobre o imóvel objeto da Inicial que requeria
reintegração de posse, sendo certo que a prova de domínio do bem é irrelevante
para fins de proteção possessória, uma vez que não se discute o direito real de
propriedade, mas apenas a existência de situação fática que configura a posse.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) se manifestou em recurso sobre reintegração de posse: "Não basta ao autor da ação de
reintegração de posse provar o domínio (ter escritura com registro em cartório
e pagar tributos). Exige-se que
demonstre a sua posse. Recurso não conhecido."[2]
São requisitos para a reintegração na posse a prova da posse anterior do
requerente, perdida mediante esbulho; o pedido de reintegração condiciona-se à
coexistência dos requisitos previstos na norma do artigo 561 do Código de
Processo Civil (CPC). As ações
possessórias têm como objetivo discutir, tão somente, o direito de posse, sendo
irrelevantes, portanto, alegações de direito de propriedade, conforme previsto
na norma do §2º do artigo 1.210 do Código Civil.[3] Para
o deferimento da liminar de reintegração de posse, se faz necessária a
comprovação do preenchimento dos requisitos do art. 561 do CPC, quais sejam a
posse anterior, o esbulho e sua data, que deverá ser inferior a ano e dia da propositura
da ação possessória. Consubstanciando-se a demonstração da posse prévia em
alegação de propriedade, deve ser indeferida a liminar possessória. Recurso
desprovido.[4]
Comprovado que o proprietário não exercia a posse do imóvel, inviável o manejo
das ações possessórias para reaver o bem.[5]
Com a decisão acima, está pavimentado o
caminho para que o presidente Lula, segundo a lei 4.132, decrete a
desapropriação do latifúndio da ex-usina Ariadnópolis e destine definitivamente
os quase 4.000 hectares de terra para a reforma agrária, o que vem sendo feito
na marra nos últimos 25 anos. Viva o MST e a luta pela terra! O conflito de Terras no Quilombo Campo Grande em
Campo do Meio, região sul de Minas Gerais perdura por 25 anos, tendo 459
famílias acampadas e cerca de 2.000 pessoas morando no território. Ao longo de
sua trajetória o acampamento passou por 11 reintegrações de posse, a mais
recente foi em agosto de 2020, no meio da pandemia, onde 14 famílias tiveram
suas casas e lavouras destruídas pelo aparato do estado em conluio com
latifundiários, bem como a Escola Popular Eduardo Galeano.
Dia 03 de junho (de 2023) realizamos na
Comunidade Quilombola de Pinhões, no município de Santa Luzia, MG, a IV Romaria
pela Ecologia Integral da Arquidiocese de Belo Horizonte, MG, que contou com a
participação de Movimentos socioambientais e mais uma vez ecoaram fortemente
gritos clamando pela anulação do leilão e assinatura do contrato do Rodoanel
(Rodominério) na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Tramita na Justiça
Federal uma Ação Civil Pública da Federação Quilombola de Minas Gerais – N’Golo
- que exige a anulação do leilão do Rodoanel feito de forma ilegal e
autoritária pelo governador de MG, Romeu Zema, dia 12 de agosto de 2022, na Bolsa
de Valores de São Paulo, SEM ter feito a necessária Consulta Prévia, Livre,
Informada, Consentida e de Boa-Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais que
serão brutalmente atingidas pelo rodominério. A Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) da ONU (Organização das Nações Unidas), tratado
internacional ratificado pelo Brasil em 2004 que o Estado faça Consulta Prévia,
Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais
toda vez que um empreendimento do Estado ou de empresas afetar estas
Comunidades. O Ministério Público Federal apresentou PARECER contundente
exigindo a anulação do leilão do Rodominério, porque foi feito sem a necessária
Consulta Prévia . Conseguirmos também na luta popular a revogação da Resolução
do Zema/SEMAD/SEDESE, que amordaçava e aniquilava o Direito à Consulta ao
tentar impor que em Minas Gerais a empresa que fosse implementar um projeto do
grande capital tivesse o direito de fazer a Consulta às Comunidades
Tradicionais, em apenas 100 dias, um absurdo inaceitável, pois seria o mesmo
que “raposa consultar as galinhas no galinheiro” para determinar a ordem de
morte para todas as galinhas.
Dia 04 de junho, realizamos o VI Abraço
na Serra do Curral em Belo Horizonte, na divisa com Nova Lima, MG. Após
concentração no Parque das Mangabeiras, subimos a pé uns 6 Km de caminhada até
o Pico Belo Horizonte, que está tendo sua base carcomida pela mineradora
Ipabra, sendo que do outro lado do Pico Belo Horizonte está a cratera da Mina de
Águas Claras, que carcomeu quase toda a Serra do Curral, atrás do bairro
Mangabeiras. Vimos que a “casquinha” da Serra do Curral, que ainda resiste
impedindo que uma “montanha” de água da cratera da Mina de Águas Claras cause
um tsunami inundando dezenas de bairros de BH. Filmamos no local um
“grampeamento” com “cimento e ferro” desta “casquinha” de Serra do Curral, pois
estava em processo de erosão e rachaduras.
Dia 05 de junho (de 2023), Dia do Ambiente,
que nos interpela a defender com ardor os territórios, exercitando nosso
Direito de dizer NÃO aos grandes projetos do capital e defender a alegria de conviver
em um ambiente livre e sadio, dezenas de representantes de Movimentos
socioambientais, Povos Indígenas e parlamentares de esquerda, lançamos, em Ato
Público, na Prainha da Represa de Vargem das Flores, em Contagem, MG, o Decreto
Popular de Emergência Climática em Minas Gerais, considerando que durante o 19º
Acampamento Terra Livre realizado em Brasília, entre os dias 24 e 28 de abril
de 2023, a Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) decretou
Emergência Climática Nacional fazendo eco ao clamor de cura da Mãe Terra. No Decreto
Popular consta que “nas Minas Gerais não é diferente, pois com o governador
Zema, em conluio com as grandes mineradoras, a “boiada” segue passando a todo
vapor e, infelizmente, nos Gerais, ela é reforçada pelo trem da mineração, que
solapa vidas e o meio ambiente.”
Entre muitas denúncias, no Decreto está
que “O megaprojeto de construção do Rodoanel Metropolitano, concessão pública
repleta de ilegalidades e violações que, na verdade, deveria se chamar
“Rodominério”, talvez seja o melhor exemplo da opção do governo Zema pelo
aprofundamento do rodoviarismo altamente poluente, baseado no veículo
individual privado, ao invés do fomento e investimentos em transporte público e
modais não motorizados, como determina a Política Nacional de Mobilidade Urbana
(Lei nº 12.587/2012). Ainda, o bilionário Rodominério, no qual o Zema quer usar
os recursos da reparação dos atingidos pelo crime da Vale em Brumadinho,
representa um projeto para viabilizar o escoamento de minério de diversas
mineradoras para a criminosa Vale.”
No final do Decreto de Emergência
Climática consta: “Para que possamos zelar pelo bem viver, contribuindo com o
equilíbrio climático, decretamos a viva voz Emergência Climática nas
Minas Gerais e reivindicamos de todos os poderes do Estado:
1.
Revogação imediata da concessão privada de construção e operação do
Rodoanel Metropolitano;
2.
Respeito à Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé da
Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT);
3.
Demarcação das terras indígenas;
4.
Reconhecimento, proteção e titularização das comunidades quilombolas
rurais e urbanas;
5.
Proteção da Serra do Curral, da Mata do Baleia e de todas as serras,
matas e águas de nosso estado;
6.
Respeito aos Povos e Comunidades Tradicionais do Norte de Minas,
dos Vales do Jequitinhonha e do Rio Pardo, fortemente afetados e
ameaçados pela política de destruição do governo Zema com projetos como o “Vale
do Lítio”, Nova Aurora, SAM e Mineroduto, que envolve a venda destruição de
nossos territórios, reduzindo-os a “riquezas minerais”, para o capital
estrangeiro. Não somos Vale do Lítio, somos Vale do Jequitinhonha! Somos Gerais
e não distritos ferríferos. Em defesa da Serra e dos Povos do
Espinhaço.
7.
Regularização dos territórios e Certificação de autorreconhecimento
dos Povos e Comunidades Tradicionais e respeito aos seus modos de vida;
8.
Criação do Comitê Mineiro de Mudanças Climáticas (CMMC) com participação
majoritária da sociedade civil organizada;
9.
Atualização e implementação do Plano Nacional sobre Mudança do Clima,
incluindo os planos de ação para a prevenção e o controle do desmatamento nos
biomas e os planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças
climáticas;
10.
Imediata posse e reativação da Comissão Estadual de Povos e
Comunidades Tradicionais (CEPCT), com orçamento próprio e condições de
funcionamento, para que tenhamos no estado de Minas Gerais um espaço
institucional de proteção desses povos;
11.
Revisão da composição do COPAM garantindo representação
paritária entre estado e organizações sociedade civil, representada
efetivamente pelas organizações ambientalistas e não pelas concessionárias e
entidades representativas do setor econômico;
12.
Estabelecimento de Zonas Livres de Mineração, com respeito e
garantia definitiva dos nossos Parques, Reservas e Unidades de Conservação:
Gandarela, MONA Moeda etc. no intuito de coibir as permanentes tentativas de
ataque e desafetação dessas áreas e suas zonas de entorno.
13.
Manutenção da COPASA como patrimônio público do povo mineiro. Não
à privatização!”
Sigamos firmes na
luta por direitos, com mobilização popular, na certeza de que somente com a
união das forças vivas da sociedade é possível alcançar conquistas e empreender
a necessária transformação do Estado e da sociedade, de forma que seja justa,
fraterna, com respeito à vida em toda sua biodiversidade.
06/06/2023
Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto
tratado, acima.
1 - Decreto de
Emergência Climática em MG: Mov. Socioambientais/ Partidos de esquerda, Vargem
das Flores
2 - Arquidiocese
de BH realiza IV Romaria pela Ecologia Integral em Pinhões, Santa Luzia/MG.
Vídeo 4
3 - Denúncia da
mineração devastadora na RMBH: IV Romaria pela Ecologia Integral, Pinhões, Sta
Luzia/MG
4 - Denúncia do
Rodoanel, Rodominério na RMBH: IV Romaria pela Ecologia Integral, Pinhões/Santa
Luzia/MG
5 - VI Abraço na
Serra do Curral em BH/MG: Parque Nacional da Serra do Curral, JÁ! Fora,
mineração! Víd1
6 - NÃO AO MARCO TEMPORAL E AO PL 490. Senado e STF, DERRUBEM este PL do
genocídio! Por frei Gilvander
7 - IV Romaria pela Ecologia Integral em Santa Luzia MG na
Comunidade Quilombola de Pinhões. Vídeo 1
8 - MST conquista sentença judicial q garante posse do
Quilombo Campo Grande p 500 famílias, no sul d MG
[1]
Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG;
licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo
ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma,
Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas;
prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo
Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com
, www.brasildefatomg.com.br
, www.revistaconsciencia.com
, www.racismoambiental.net.br
e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com
– www.gilvander.org.br
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III
[2] STJ. 4ª Turma. REsp nº
150.267/PE. Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ: 29/05/00, pág. 157.
[3] TJMG - Apelação
Cível 1.0024.12.262011-5/001, Relator(a): Des.(a) Cabral da Silva , 10ª CÂMARA
CÍVEL, julgamento em 04/06/2019, publicação da súmula em 14/06/2019.
[4] TJMG - Agravo de Instrumento-Cv
1.0000.18.112290-4/001, Relator(a): Des.(a) Amorim Siqueira, 9ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 02/04/2019, publicação da súmula em 12/04/2019.
[5] TJMG - Apelação
Cível 1.0433.11.030791-8/001, Relator(a): Des.(a) Claret de Moraes , 10ª CÂMARA
CÍVEL, julgamento em 29/01/2019, publicação da súmula em 08/02/2019.